terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

sagacidade

Cfr. comentário a este texto do Sr Juiz Desembargador Francisco Bruto da Costa, que,com a devida vénia, reproduzo:

«Não sabia que "A lei admite expressamente a realização de buscas a escritórios de advogados, desde que autorizadas pelo juiz de instrução e fundamentadas na suspeita de ali se encontrarem objectos relacionados com crimes ou que possam servir de prova" (releve-se-me a ignorância, há mais de 20 anos que não trabalho com Direito Criminal).
Só posso entender tal norma se o próprio Advogado for suspeito de um crime
Se assim não for, então tenho de concluir que o Estado português deixou de ser um Estado de Direito.
Porque, na minha opinião e enquanto Juiz, me parece perfeitamente razoável que num Estado de Direito os Advogados tenham nos seus escritórios elementos porventura incriminadores dos seus clientes sem que tal facto postule uma devassa judicial.
Na minha perspectiva, o Advogado é padre, irmão, pai e Juiz do seu cliente, tem de o avaliar até ao tutano, tem de conhecer ao mais ínfimo detalhe todos os dados da questão que o cliente lhe coloca - para isso tem de conhecer detalhes confidenciais, porventura comprometedores, que só o cliente lhe pode revelar e que não têm que ser revelados à autoridade que investiga o crime.
Tais detalhes estão resguardados pelo sigilo profissional, que na advocacia tem um relevo incontornável - e, digo eu, muito estimável, porque é a minha garantia, enquanto cidadão, de que o meu Advogado amanhã não vai ser incomodado só porque é meu Advogado e eu estou acusado de algum crime.
Se existe alguma disposição legal que ponha isto em causa, então o ilustre Bastonário da OA, em vez de andar para aí a clamar contra o "terrorismo de Estado" já devia ter dado entrada a um pedido de inconstitucionalidade da mesma, levantando a questão em todas as instâncias políticas e judiciais.
É que isso, nem no tempo do fascismo: antes do 25 de Abril a PIDE não invadia os escritórios dos Advogados defensores dos presos políticos porque mesmo em tempos de ditadura pura e dura se proporcionava à advocacia o exercício digno de uma defesa digna (com algumas lamentáveis excepções que deram brado na época e que aqui seria ocioso chamar à colação).
Faço questão de que todos os Advogados e cidadãos que lerem estas linhas tenham a consciência de que há muitos Juízes que pensam como eu.
A advocacia não é uma excrecência desnecessária: é, pelo contrário, um pilar essencial dom Estado de Direito.
E mais não digo - sem ser na presença do meu Advogado !
Francisco Bruto da Costa

05.Fevereiro.2009»

2 comentários:

Anónimo disse...

Que pérola, Ferreira. Merecido destaque, sim SR.
O autor do comentário merece os parabéns não só pela sagacidade, que já realçou, como pela lúcidez de raciocínio. Fico contente quando descubro argumentação desta índole.
Vou até lá.

ferreira disse...

Eu sabia que a Leonor ia gostar;)